• Portugal tenta atrair imigrantes para o interior do país

    Com incentivos como descontos tributários e imóveis a preço reduzido, cidades fora do eixo Lisboa-Porto são oportunidade para brasileiros

    Fonte: O Globo

    LISBOA - “Temos que desafiar as pessoas a ir viver no interior”. A frase da ministra da Coesão Territorial de Portugal, Ana Abrunhosa, soou como oportunidade para parte dos brasileiros residentes no país. Diante da especulação imobiliária, mercado de trabalho saturado e concorrência empresarial acirrada nos grandes centros urbanos, eles têm aceitado o desafio. Recebem em troca dezenas de benesses das Câmaras Municipais, órgãos equivalentes às prefeituras, que cedem ou oferecem prédios e terrenos a preços irrisórios, relaxam a carga fiscal e ajudam no pagamento de aluguel para combater a baixa densidade demográfica fora do eixo Lisboa-Porto.

    A iniciativa comum é pela transformação de áreas menos povoadas em pequenos eldorados, mas cada Câmara desenvolve projetos autônomos de atração, que podem ser reduções distintas de impostos e até mesmo a isenção por certo período. A estratégia de redistribuição da população é prioridade para gerar empregos em locais esvaziados ao longo dos anos pela crise econômica, pela evasão de portugueses para grandes cidades e para o exterior e pela queda da natalidade. O país não consegue ultrapassar a barreira dos cem mil nascimentos por ano. Em certos distritos do interior, houve recuo de até 18% no número de partos em 2019.

    Os cinco municípios mais densamente povoados de Portugal, com número médio entre 3,5 mil e 7,6 mil habitantes por quilômetro quadrado, pertencem às áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. A concentração, aliada ao decréscimo da camada de habitantes em idade laboral, esvazia o interior. Com um agravante: o governo prevê a perda de 1,7 milhão de trabalhadores ativos até 2040. Em 2070, 50% da população portuguesa (10,2 milhões) serão formados por pessoas fora da escala produtiva (15 a 64 anos), estima a Comissão Europeia. Hoje, 64% estão na escala produtiva. São hipóteses que causariam grandes danos demográficos.

    — Temos de criar incentivos. Há uma boa qualidade de vida (no interior), onde é fácil constituir família e conciliar a vida pessoal e profissional — disse Ana Abrunhosa.

    Emprego é contrapartida Foi o que pensou o empresário cearense Alexandre Monteiro de Carvalho. Seduzido pela qualidade de vida e segurança para criar em Portugal a filha Mariah, de 2 anos, ao lado da mulher, Evellane, teve a ideia de produzir picolés de diversos sabores usando como ingrediente básico whey protein, um suplemento alimentar. Ao pesquisar os preços dos locais para a fábrica da Whey On Ice, percebeu a impossibilidade financeira de construir em um grande centro. Foi quando olhou para o mapa da região do Alentejo e achou Montemor-O-Novo, a 107 km de Lisboa.

    — Foi muito fácil o acesso à Câmara, que deu atenção para solucionar problemas e mostrou interesse na realização do projeto — contou Carvalho.

    Mas não foi somente a boa acolhida que levou o empresário a Montemor-O-Novo, uma cidade com população de 17.400 e densidade de 12,1 habitantes por quilômetro quadrado. Além de ter aprovado pelo governo de Portugal dois projetos (um de inovação e outro de internacionalização da marca) de reembolso de um investimento total de € 3,6 milhões, obteve da Câmara local a redução do preço para a aquisição de um terreno de cinco mil metros quadrados por 70 anos, renováveis por mais 70. O valor: € 18 mil, que é o equivalente ao aluguel anual de um apartamento de três quartos e 150 metros quadrados na Baixa de Lisboa ou em área central do Porto.

    — É a arma que as cidades menores têm para atrair empresários brasileiros e gerar emprego — disse Carvalho, que precisa, como contrapartida, empregar 20 pessoas e produzir 11 milhões de picolés ao longo de cinco anos para receber um perdão de até 50% do subsídio federal.

    A Câmara de Montemor-O-Novo explica que a benesse faz parte do Sistema de Incentivos Financeiros Municipais para a Atividade Empresarial. Enquanto a obra avança, a Whey On Ice utiliza um ateliê como minifábrica e um espaço de coworking da Câmara. Tudo por € 138 mensais.

    Isolada no extremo norte do país, última cidade portuguesa antes de cruzar a fronteira com a Espanha, Bragança sempre foi preterida pela população mais jovem, que tem como primeiras escolhas as vizinhas Braga e Porto. Até a Câmara resolver rejuvenescer o perfil dos residentes. Para isto, cedeu um imóvel para ser sede da Associação Nacional dos Estudantes e Pesquisadores Brasileiros em Portugal (ANEPBP). E não foi só.

    — Não pagamos renda, energia, água, nada. A Câmara cedeu o espaço para atrair com mais sucesso os brasileiros e nos incentiva a fazer eventos e a criar uma maior movimentação na cidade. Tem dado certo. Há quatro anos, havia 40 brasileiros; hoje são mais de 500. Estamos em pleno centro histórico, não é periferia. Pensamos em Coimbra, mas decidimos pela descentralização, pela valorização do interior, que é barato para os estudantes, ao contrário de Porto e Lisboa — disse Calil Makhoul, presidente da ANEPBP.

    Subsídio ao aluguel
    A vida estudantil e de trabalho em Bragança gira em torno do Instituto Politécnico, fator de atração para os estrangeiros, que aumentam a cada ano. Ao todo, são 3.273 (eram 2.685 em 2017), sendo 794 brasileiros. A população geral é de 35.300 habitantes.

    — A Câmara decidiu ceder o espaço para atrair mais pessoas do Brasil. Mas, além disso, temos, junto com o Politécnico, um programa de residências universitárias, que oferecemos para a comunidade acadêmica — disse Hernâni Dinis Venâncio Dias, presidente da Câmara, cargo semelhante ao de prefeito.

    Em Vouzela, distrito de Viseu com pouco mais de dez mil habitantes, no Norte, a Câmara decidiu ajudar no pagamento dos aluguéis para atrair residentes e comerciantes. O presidente do município, Rui Ladeira, conta que há 30 processos de estrangeiros, mas não especifica a nacionalidade. Para os aprovados, a Câmara pagará entre 20% e 40% do valor do aluguel durante três anos. E também apoiam o pagamento de aluguel comercial com subsídio de até 50% do valor mensal para quem abrir negócio na região.

    Ladeira cita a transferência para Vouzela de uma empresa de cosméticos de São Paulo, que será isenta do imposto sobre o lucro por três anos, além de adquirir terreno a preço baixo. Também foi beneficiada com redução pela metade das taxas de licenciamento.

    Fonte: O Globo


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